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Alimentos gravídicos: a assistência durante e após o parto pode ser inserida no conceito de “despesas” previsto na Lei 11.804, de 05 de novembro de 2008?

Alimentos gravídicos: a assistência durante e após o parto pode ser inserida no conceito de “despesas” previsto na Lei 11.804, de 05 de novembro de 2008?

A obrigação alimentar pode ter início antes mesmo do nascimento com vida, ou seja, ainda na fase gestacional. Nesse caso, como a legislação brasileira reconhece a existência de direitos ao nascituro (art. 2º, CC/2002[1]), é possível que a gestante proponha Ação de Alimentos Gravídicos com o objetivo de proporcionar ao(a) filho(a) desenvolvimento e nascimento dignos.

Embora o art. 2º, da Lei n. 11.804/2008[2], ao estabelecer as despesas que devem abranger a fixação dos alimentos, indique que elas são destinadas à própria gestante, elas se prestam, em última análise, à manutenção do nascituro, compreendendo os valores necessários para fazer frente às despesas do período de gravidez e que sejam delas decorrentes, incluindo as relativas à alimentação especial, assistência, médica e psicológica, exames complementares, internações, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas. Em outras palavras, a gestante é beneficiária imediata dos alimentos, mas os direitos do nascituro acabam também sendo resguardados[3].

Para a definição da obrigação alimentar na fase gestacional é exigido o preenchimento dos mesmos elementos em relação àqueles decorrentes do parentesco confirmado com o nascimento com vida, quais sejam: necessidade – possibilidade – proporcionalidade[4]. Ou seja, os alimentos gravídicos também devem ser fixados de acordo com as necessidades de quem os pede – nesse caso, da gestante –, com os recursos da pessoa obrigada e de forma proporcional, a partir das particularidades do caso concreto. Contudo, em relação à comprovação do vínculo de parentesco, a Lei n. 11.804/2008 se contenta apenas com indícios de paternidade. Dessa forma, não se exige certeza do alegado vínculo de paternidade para fins de fixação de alimentos gravídicos, bastando que haja elementos probatórios mínimos a indicar a paternidade.A título de exemplo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais já considerou como indício a apresentação de fotografias e prints de conversas mantidas por aplicativo de mensagens[5]. Há precedente no mesmo sentido no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[6], além de diversos outros julgados que admitem, por exemplo, a declaração de testemunhas a respeito do relacionamento constituído entre a gestante e o possível pai da criança.

Com o nascimento com vida, os alimentos gravídicos anteriormente concedidos à gestante serão convertidos em pensão alimentícia em favor do recém-nascido, com mudança, assim, da titularidade dos alimentos. Não há necessidade de que a gestante formule pedido nesse sentido, nem que haja prévio pronunciamento judicial, pois essa alteração decorre da própria legislação (art. 6º, parágrafo único, Lei n. 11.804/2008). Dessa forma, mesmo que o nomen iuris da ação tenha relação com a gravidez, não há falar em extinção pela perda do objeto com o nascimento da criança. Com efeito, não há razões para que a própria criança, representante por sua mãe, proponha uma nova demanda judicial após o nascimento, pois os alimentos gravídicos ficarão convertidos em pensão alimentícia até eventual ação revisional em que se solicite a exoneração, redução ou majoração do valor dos alimentos ou até mesmo eventual resultado em ação de investigação ou negatória de paternidade.

Dúvida que pode surgir está relacionada à extensão das “despesas” abrangidas pelo art. 2º da Lei 11.804/2008. Como vimos, a legislação é genérica e admite o custeio de todos os procedimentos necessários à manutenção da gestante. Uma mulher com diabetes gestacional, por exemplo, depende de uma alimentação diferenciada e de acompanhamento nutricional, além da assistência obstétrica decorrente do pré-natal. O aumento da pressão arterial durante a gravidez é outro fator que pode comprometer tanto a saúde da gestante quanto a do bebê, sendo imprescindível o monitoramento constante da gestante hipertensa e que por vezes é mais oneroso do que aquele destinado às gestações de risco habitual.

Costuma-se dizer que os alimentos decorrentes de parentesco já reconhecido possuem maior amplitude do que aqueles destinados ao período gestacional. Ocorre que essa conclusão não pode significar qualquer espécie de redução do apoio à gestante, inclusive através de instrumentos que proporcionem maior conforto físico e emocional antes e após o parto.

Na última Jornada de Direito Civil realizada como Conselho da Justiça Federal – Edição IX, de maio de 2022 – foi aprovado o seguinte enunciado doutrinário: As despesas com doula e consultora de amamentação podem ser objeto de alimentos gravídicos, observando o trinômio da necessidade, possibilidade e proporcionalidade para sua fixação”.

A doula é profissional que atua durante a gestação, parto e puerpério, proporcionando à gestante a conquista de um parto digno e respeitoso, independentemente da via escolhida ou orientada pelo médico. A doula estimula o protagonismo da gestante, fornecendo orientações sobre educação perinatal, além de subsídios para o alívio da dor durante o parto. Ela não substitui o trabalho da enfermeira obstetra, muito menos do(a) médico(a) obstetra; na verdade, atua como parte integrante de um atendimento multidisciplinar que deveria ser destinado a todas as mulheres.

Além de melhorar a vivência experimentada pelas gestantes, a doula exerce influência direta e positiva sobre a saúde das mulheres e dos recém-nascidos. Assim, resta claro que o trabalho exercido pela doula pode ser incluído no pedido de alimentos gravídicos.

Em alguns estados brasileiros, como no caso de São Paulo, a função da doula é amplamente reconhecida pela legislação local (Lei n. 16602, de 23/12/2016). Em Santa Catarina, desde 2016 as maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares congêneres, da rede pública e privada doEstado, estão obrigadas a permitir apresença de doulas durante todo o período de trabalho departo, parto e pós-parto imediato, sempre que solicitadas pela parturiente (art. 1º da Lei nº 16.869/16).No Estado do Paraná foi aprovado recentemente (abril de 2022) projeto de lei que semelhante ao que já se encontrava em vigor do Estado de Santa Catarina. Esse avanço legislativo certamente facilita o pedido judicial para inclusão das despesas com esse tipo de profissional no pedido de alimentos gravídicos.

No Brasil[7], infelizmenteainda não há obrigatoriedade desse tipo de assistência custeado pelo Sistema Único de Saúde, razão pela qual o serviço de doula, como regra[8], exige contribuição pecuniária da própria gestante. De toda forma, seja em hospitais privados ou em hospitais públicos, a doula deve ser admitida a acompanhar a gestante, sempre que assim for solicitado.

Em relação à segunda parte do enunciado doutrinário do CJF, é importante destacar que a consultora de amamentação, embora possa atuar na fase gestacional, é de extrema importância durante o puerpério, especialmente nas primeiras semanas de lactação, em que o risco de lesões, obstruções e processos inflamatórios e infecciosos são mais comuns. A assistência, nesse caso, abrangerá a criança, que é a principal beneficiária de uma amamentação saudável. Assim, mesmo que a titularidade dos alimentos seja alterada com o nascimento, não há impedimento para que as despesas com amamentação também sejam pagas pelo devedor dos alimentos, servindo, assim, para afirmação de uma paternidade responsável e almejada pelo texto constitucional (art. 226, §7º, CF/88).

Tatiane Donizetti


[1]O nascituro é titular de direitos. Há situações especificas em que a lei e a jurisprudência conferem proteção jurídica ao nascituro, como é o caso dos alimentos gravídicos e do salário maternidade (AgRg no AREsp 593933/SP, DJE 07/05/2018).

[2]“Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive asreferentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes”. 

[3]“(…) Os alimentos gravídicos não se confundem com pensão alimentícia, pois, diferentemente desta que se destina diretamente ao menor, aqueles visam a auxiliar a mulher gestante nas despesas decorrentes da gravidez, da concepção ao parto, sendo, pois, a gestante a beneficiária direta dos alimentos gravídicos, ficando, por via de consequência, resguardados os direitos do próprio nascituro” (STJ, Resp n. 1629423/SP Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze, Data de Julgamento: 06/06/2017, Terceira Turma, Data de Publicação: 22/06/2017). Na doutrina se destaca o mesmo entendimento: “Sem embargo de o art. 1º da Lei nº 11.804⁄2008 afirmar que o seu propósito é disciplinar o direito de alimentos da mulher gestante, não há como negar que rege igualmente o direito de alimentos da pessoa concebida e cujo nascimento se espera, isto é, aquele que ainda se encontra em estado de maturação no ventre materno (nascituro)” (A tutela jurisdicional do direito a alimentos gravídicos: análise às técnicas processuais diferenciadas instituídas pela Lei nº 11.804/2008. In : Biblioteca Digital Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 17, n. 68, out. 2009).

[4]AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS GRAVÍDICOS PROVISÓRIOS. INDÍCIOS DE PATERNIDADE. FIXAÇÃO COM RAZOABILIDADE. 1. A ação de alimentos gravídicos admite a existência de meros indícios de paternidade, não sendo necessária a efetiva comprovação do vínculo de parentesco. 2. A fixação de alimentos gravídicos deve observar, além do binômio necessidade e capacidade, a razoabilidade, ante impossibilidade de análise aprofundada da situação financeira do alimentante e das necessidades reais da gestante. 3. Agravo conhecido e parcialmente provido(TJ-DF 0700017-91.2020.8.07.9000, Relator: Fábio Eduardo Marques Data de Julgamento: 27/05/2020, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 12/06/2020).

[5]AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS GRAVÍDICOS. INDÍCIOS DE PATERNIDADE. CONVERSAS PELO WHATSAPP. FOTOGRAFIAS. BINÔMIO NECESSIDADE / POSSIBILIDADE. PROVA SUFICIENTE. 1. A fixação de alimentos gravídicos pressupõe a coexistência de indícios de paternidade e de elementos que apontem a necessidade da gestante e a possibilidade do suposto pai. 2. As fotografias e prints de conversas mantidas pelo aplicativo Whatsapp entre a gestante e o suposto pai traduzem indícios de paternidade(TJ-MG, AI: 10000210992731001 MG, Relator: Carlos Henrique Perpétuo Braga, Data de Julgamento: 09/12/2021, 19ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 16/12/2021).

[6]ALIMENTOS GRAVÍDICOS – Confirmação por mensagens da existência de relacionamento sexual entre as partes, sem prevenção, e sem a indicação de outros relacionamentos pela gestante, são indícios de paternidade suficiente para que sejam fixados os alimentos gravídicos – Os alimentos gravídicos visam a auxiliar a mulher gestante nas despesas decorrentes da gravidez – Na sua fixação deve-se ter em conta o indispensável para garantir uma boa gestação e o parto, tendo menor amplitude que os alimentos decorrentes do parentesco e da solidariedade entre cônjuges e companheiros, que compreendem tudo que é necessário à vida – Fixação mantida – Recurso desprovido. (TJ-SP, AC1000943-29.2019.8.26.0165, Relator: Alcides Leopoldo, Data de Julgamento: 19/06/2020, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/06/2020).

[7]Na Nova Zelândia, por exemplo, o parto domiciliar com o auxílio de doula é custeado pelo Governo.

[8]Há hospitais que fazem atendimento pelo SUS e ofertam o serviço de doula. No entanto, ainda não se trata de regra no serviço público de saúde do país.


Elpídio Donizetti Sociedade de Advogados

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