Sob uma perspectiva dinâmica, o processo constitui-se por uma série de atos processuais, entre os quais a petição inicial, a citação, as decisões judiciais, entre inúmeros outros.
Mas quais são os atos típicos do processo executivo?
Para responder tal pergunta, deve-se lembrar que, no processo de conhecimento, os principais atos processuais são os postulatórios, praticados pelas partes, e os de pronunciamento (decisórios ou não), praticados pelo juiz. Na execução, a par dessas espécies de atos processuais, são de inegável importância os atos de constrição judicial, entendidos como aqueles que invadem o patrimônio do devedor para assegurar a eficácia da execução, ou seja, para realizar o direito do credor.
Entre os atos postulatórios praticados na execução, merecem destaque a petição ou requerimento inicial – obviamente, visto que o Estado deve ser provocado para prestar a tutela executiva – e a indicação de bens à penhora. A rigor, tais atos seriam suficientes para que o Estado desencadeasse toda a atividade executiva, impulsionando o processo até a satisfação do direito do exequente. Todavia, as situações vivenciadas em cada caso são mais diversas do que a simples propositura da demanda e a indicação de bens para penhora, daí por que pode o exequente desistir da ação executiva, formular requerimento de reforço da penhora, de prisão do devedor de alimentos, entre outros inúmeros atos postulatórios previstos ou não no ordenamento jurídico; de outro lado, pode o executado apresentar objeção de pré-executividade, requerer a redução da penhora ou a substituição de bens penhorados em desconformidade com a ordem legal ou sem observância dos critérios de impenhorabilidade.
Provocada a jurisdição, incumbe ao juiz impulsionar o processo até o seu fim, por meio de despachos, decisões interlocutórias e sentenças. Também os atos ordinatórios contribuem para esse mister, porém devem ser praticados de ofício pelo servidor e apenas revistos pelo juiz quando for necessário (art. 203, § 4º).
Na execução, contrastando com o tema atos típicos do processo executivo, assumem especial relevo os despachos e as decisões interlocutórias. Os primeiros referem-se às determinações de citação e penhora, de expedição do edital de alienação em hasta pública, entre outros; as decisões, por sua vez, referem-se a todas as questões resolvidas no curso do processo, como o simples indeferimento de bem nomeado à penhora. Quanto à sentença, importa anotar que sua função na execução é unicamente a de pôr fim no processo, uma vez que não há mérito a ser solucionado pelo órgão judicial.
Além dos atos postulatórios e dos pronunciamentos judiciais, merecem destaque na execução os já mencionados atos constritivos, cujo fim é preparar a satisfação do credor por meio da invasão e subsequente afetação do patrimônio do devedor. O exemplo clássico de constrição judicial é a penhora, mas existem outros atos destinados a essa mesma finalidade, tais como o arresto cautelar (art. 830, caput) e, na execução de obrigação de entrega de coisa certa, a busca e apreensão de bens móveis e a imissão na posse de imóvel (art. 806, § 2º).
O Código de Processo Civil atual, além das medidas ditas propriamente executivas, prevê, nos §§ 3º e 4º do art. 782, a possibilidade de o juiz, a requerimento da parte, determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes (SPC e SERASA, por exemplo). Essa medida configura uma restrição de acesso ao crédito por parte do executado, que apenas complementa – e não substitui – as demais medidas executivas, nem impede que, administrativamente, o credor já providencie a inclusão da restrição, inclusive por intermédio do protesto do título.
Na prática, a “negativação” prevista nos §§ 3º e 4º do art. 782 só será eficaz para o credor se o executado não estiver com o nome inserido nos órgãos de proteção ao crédito por outro motivo. Caso o nome do devedor já esteja “sujo”, dificilmente uma nova restrição acarretará efeitos práticos vinculados à satisfação da dívida.
Esse requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes não depende de comprovação prévia de recusa administrativa por parte de entidades mantenedoras do respectivo cadastro (SPC e SERASA, por exemplo). Assim decidiu a 3ª Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.835.778/PR, de Relatoria do Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 04.02.2020, Informativo 664. Dessa forma, não cabe ao juiz limitar o pedido do exequente à demonstração de que houve prévia tentativa administrativa de inclusão do nome do devedor no cadastro negativo.
Ademais, importante frisar que a negativação administrativa não impossibilita a inclusão judicial do nome do autor no mesmo cadastro. Trata-se de posicionamento consolidado na doutrina e evidenciado nos seguintes enunciados:
- “O art. 782, §3º, não veda a inclusão extrajudicial do nome do executado em cadastros de inadimplentes, pelo credor ou diretamente pelo órgão de proteção ao crédito” (Enunciado 190, FPPC);
- “O art. 782, §3º, do CPC, não veda a possibilidade de o credor, ou mesmo o órgão de proteção ao crédito, fazer a inclusão extrajudicial do nome do executado em cadastros de inadimplentes” (Enunciado 98, I Jornada de Processo Civil do CJF).
Recentemente o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o juiz goza de certa discricionariedade sobre tal deliberação. Contudo, o requerimento do exequente não pode ser indeferido tão somente sob o fundamento de que o(s) credore(s) já possui(em) meios técnicos e a expertise necessária para promover a inscrição direta junto aos órgãos de proteção ao crédito. A tese foi fixada no julgamento do REsp nº. 1.887.712/DF, divulgado no último Informativo da Corte (n. 682). A 3ª Turma do STJ, por unanimidade, registrou que:
“(…) o dispositivo legal que autoriza a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes exige, necessariamente, o requerimento da parte, não podendo o juízo promovê-lo de ofício. Ademais, depreende-se da redação do referido dispositivo legal que, havendo o requerimento, não há a obrigação legal de o Juiz determinar a negativação do nome do devedor, tratando-se de mera discricionariedade. A medida, então, deverá ser analisada casuisticamente, de acordo com as particularidades do caso concreto. Não cabe, contudo, ao julgador criar restrições que a própria lei não criou, limitando o seu alcance, por exemplo, à comprovação da hipossuficiência da parte. Tal atitude vai de encontro ao próprio espírito da efetividade da tutela jurisdicional, norteador de todo o sistema processual” (Trecho do voto da Min. Relatora Nancy Andrighi).
Em suma, se tratando de atos típicos do processo executivo, a anotação do nome do executado em cadastros de inadimplentes configura um meio executivo adicional à disposição da parte exequente, cuja finalidade maior é satisfazer o crédito submetido à execução. A inclusão da “negativação” é providência que pode se dar no âmbito administrativo e, também, na esfera judicial, decorrente de atos típicos do processo executivo. “O fato da parte credora não demonstrar a impossibilidade de inscrever o nome do executado nos cadastros de inadimplentes não pode ser justificativa para a negativa judicial do pleito, pois é medida que pode ser operacionalizada mediante emissão de ofício pela secretaria do juízo de origem ao órgão de proteção ao crédito” (REsp nº. 1.887.712/DF, DJE 12/11/2020). Privilegia-se, assim, a duração razoável do processo e o princípio da efetividade da execução.
Elpídio Donizetti
P.S: após a edição desse post, o STJ decidiu que a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes também se aplica às execuções fiscais. Foi firmada a seguinte tese (tema 1026 – Recurso Repetitivo): “O art. 782, §3º, do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa – CDA”