Pode ocorrer de uma pessoa que seria chamada à sucessão morrer antes de esta ser aberta, ou de morrer simultaneamente ao autor da herança, ou ser excluída da sucessão, o que produzirá o efeito de se considerá-la premorta (art. 1.816 do Código). Nesses casos, se a pessoa premorta, morta simultaneamente ou excluída se encontrar na classe dos ascendentes, ou se for o cônjuge ou companheiro, seu direito sucessório se extinguirá prematuramente. Por outro lado, se a pessoa se encontrar na classe dos descendentes ou dos colaterais, a lei porá a salvo seu direito sucessório. Se o sucessor premorto, morto simultaneamente ou excluído era descendente ou irmão do autor da herança, e deixou descendentes próprios – necessariamente filhos, em se tratando de irmão (art. 1.840, segunda parte) –, estes serão chamados a representá-lo na sucessão.
As pessoas chamadas à sucessão representando o su- cessor premorto, morto simultaneamente ou excluído herdam por direito de representação.
Direito de representação, portanto, é o direito dos descendentes de descendentes e dos filhos de irmãos do autor da herança de representar, na sucessão, o sucessor premorto à sua abertura, morto simultaneamente ao autor da herança, ou excluído da sucessão, em todos os direitos em que o representado sucederia (art. 1.851).
Frise-se: no nosso Direito, apenas os descendentes de descendentes (art. 1.833 e art. 1.852, primeira parte) e os filhos de irmãos (art. 1.840, segunda parte, e art. 1.853) têm direito de representação. Na linha ascendente não há direito de representação (art. 1.852, segunda parte).
Os que herdam por representação têm direito apenas àquilo que caberia ao sucessor representado (art. 1.854), que será entre eles repartido (art. 1.855). Ou seja, os representantes sucedem o autor da herança por estirpe, e não por cabeça.
Frise-se que somente o herdeiro premorto – ou morto simultaneamente ao autor da herança – (art. 1.851) e o herdeiro excluído (art. 1.816) podem ser representados; o herdeiro renunciante, não. Logo, não há direito de representação para os descendentes do renunciante (art. 1.811, primeira parte).
Nada impede, todavia, a sucessão dos descendentes do renunciante, mas por direito próprio, na hipótese de o renunciante ser o único herdeiro do grau chamado à sucessão, ou de todos os herdeiros daquele grau renunciarem, caso em que a herança se defere ao próximo grau na classe (art. 1.810, parte final, e art. 1.811, segunda parte).
Ademais, a lei expressamente permite que o renunciante à sucessão de uma pessoa a represente na sucessão de outra (art. 1.856). Ou seja, o filho que renunciou à sucessão do pai pode, não obstante, representá-lo na sucessão do avô, se quiser.
Examinando o esquema, o leitor percebe que o direito de representação tem lugar quando o sucessor que seria chamado à sucessão, por ter morrido antes de sua abertura, ou concomi- tantemente a ela, ou por ter sido dela excluído, é representado por seus herdeiros, que recebem a herança diretamente do seu autor. Note-se que quando há direito de representação também se sucede sempre por estirpe, vez que os herdeiros representantes não são considerados no cálculo do fator de divisão, o qual, no exemplo, é dois (levam-se em conta A e B, descendentes de primeiro grau, ou seja, os dois ramos que partem do autor da herança).
Com essa simplicidade o direito de representação foi delineado pela nossa doutrina clássica[1]. No entanto, desde que Carlos Maximiliano publicou o seu Direito das sucessões, alguns civilistas passaram a repetir o que aquele jurista chamou de “requisitos do direito de representação”, que seriam: ter o representado falecido antes do autor da herança, exceto em caso de indignidade; ser o representante descendente do representado; ter o representante, quando da abertura da sucessão, legitimidade para herdar do representado; não haver solução de continuidade nos graus. Tais requisitos se depreendem da nossa exposição da matéria. Não obstante, considerando que o leitor poderá se deparar com essa enumeração em seus estudos, teceremos breves comentários sobre ela.
Sobre o primeiro requisito – ter o sucessor representado morrido antes do autor da herança – nada mais é necessário esclarecer. Todavia, cumpre frisar que a morte anterior à abertura da sucessão é justamente o traço distintivo entre o direito de representação e o direito de transmissão.
E não se pode perder de vista que o efeito da morte simultânea, ainda que por aplicação da presunção de que trata o art. 8o nos casos de comoriência, é o mesmo efeito da morte anterior.
Quanto ao segundo requisito – ser o representante descendente do representado –, im- pende destacar que somente têm direito de representação os descendentes de descendentes, infinitamente, e os descendentes de primeiro grau de colaterais de segundo grau, ou seja, os filhos de irmãos do de cujus. O leitor deve notar que essa limitação não existe no direito de transmissão, que é de titularidade de qualquer sucessor do herdeiro transmitente.
Pouco há que se comentar sobre a legitimidade para suceder exigida do representante quando da abertura da sucessão, vez que no Direito pátrio atual toda pessoa nascida ou ao menos concebida tem abstratamente legitimidade para suceder. Diferentemente do que ocorria no Direito anterior, em que a legitimidade para suceder dos filhos gerava diversos conflitos, em razão da distinção entre filhos legítimos e as diversas categorias de ilegítimos, e ainda entre filhos biológicos e adotados, no Direito de hoje não há mais problemas. Se o filho era ao menos concebido ao tempo da abertura da sucessão, tem ele capacidade de suceder seus parentes. Não é relevante nem mesmo o momento do reconhecimento da filiação, porquanto tal reconhe- cimento sempre produz efeitos retroativos à data da concepção.
Por fim, o que se quer dizer com “não haver solução de continuidade de graus” é que não há direito de representação de pessoa viva (salvo a excluída da sucessão, que o Direito das Sucessões considera morta). Ou seja, um descendente de grau mais remoto não pode saltar um descendente vivo de grau mais próximo para pleitear a herança por representação. Daí por que a renúncia da herança não gera o direito de representação para os descendentes do renunciante.
* Texto e imagem foram extraídos do Curso de Direito Civil, de autoria de Elpídio Donizetti, Felipe Quintella Hansen Beck e Tatiane Donizetti.
[1] PINTO, Antônio Joaquim Gouveia. Tratado dos testamentos e sucessões. Adaptado ao Direito bra- sileiro por Augusto Teixeira de Freitas. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1881. p. 353-358; OLIVEIRA, Arthur Vasco Itabaiana de. Tratado, cit., p. 101-105; BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das sucessões, cit., p. 108-121; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições, cit., v. VI, p. 74-81.