Os filhos podem ser reconhecidos de forma voluntária ou judicial. Especificamente quanto à segunda forma, deve ser proposta ação de investigação de paternidade, disciplinada pela Lei n. 8.560, de 29 de dezembro de 1992.
Em relação à prescrição, é pacífico o entendimento da jurisprudência no sentido de que as ações de investigação de paternidade são IMPRESCRITÍVEIS, sendo inaplicável o art. 1.614 do Código Civil: “O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação”. A propósito, há entendimento sumulado pelo STF sobre a matéria: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança” (Súmula 149).
Há outra súmula bastante conhecida sobre essa temática, editada pelo STJ, com o seguinte teor: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”. O enunciado quer dizer que se houver a recusa do requerido em se submeter ao exame, a sua paternidade será declarada na sentença, caso não existam outras provas que invalidem a presunção. Posteriormente, em 2009, esse enunciado foi consagrado na legislação, precisamente no art. 2º-A, parágrafo único, da Lei 8.560/1992:
Art. 2º-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos.
Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.
Recentemente o STJ estendeu essa presunção a partir da interpretação do art. 139, IV, CPC/2015, que consagra dentre os poderes do juiz o de “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. Imagine, por exemplo, que em razão do falecimento do suposto pai, você promove ação de investigação de paternidade contra os irmãos do falecido (supostos tios). Nessa hipótese, segundo entendimento do STJ, como advogado(a) do requerente você poderá pleitear a adoção de medidas coercitivas pelo julgador, visando obrigar os requeridos a fornecer o material genético, privilegiando-se, assim, o direito ao conhecimento sobre a origem biológica. Confira:
“O juiz deve adotar todas as medidas indutivas, mandamentais e coercitivas, como autoriza o art. 139, IV, do CPC, com vistas a refrear a renitência de quem deve fornecer o material para exame de DNA, especialmente quando a presunção contida na Súmula 301/STJ se revelar insuficiente para resolver a controvérsia. O propósito da presente reclamação é definir se a sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito, sob fundamento de que deveria ser respeitada a coisa julgada formada em anterior ação investigatória de paternidade, afrontou a autoridade de decisão proferida por esta Corte na ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP. Na referida decisão, determinou-se a apuração de eventual fraude no exame de DNA realizado na primeira ação investigatória e a realização de novo exame para a apuração de eventual existência de vínculo biológico entre as partes. O acórdão desta Corte concluiu que o documento apresentado pela parte configurava prova indiciária da alegada fraude ocorrida em anterior exame de DNA e, em razão disso, determinou a reabertura da fase instrutória. Dessa forma, não pode a sentença, valendo-se apenas daquele documento, extrair conclusão diversa, no sentido de não ser ele suficiente para a comprovação da fraude, sob pena de afronta à autoridade da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça. Determinado pelo STJ que fosse realizado novo exame de DNA para apuração da existência de vínculo biológico entre as partes, não pode a sentença, somente com base na ausência das pessoas que deveriam fornecer o material biológico, concluir pelo restabelecimento da coisa julgada que se formou na primeira ação investigatória (e que foi afastada por esta Corte), tampouco concluir pela inaplicabilidade da presunção contida na Súmula 301/STJ, sem que sejam empreendidas todas as providências necessárias para a adequada e exauriente elucidação da matéria fática. A impossibilidade de condução do investigado “debaixo de vara” para a coleta de material genético necessário ao exame de DNA não implica a impossibilidade de adoção das medidas indutivas, coercitivas e mandamentais autorizadas pelo art. 139, IV, do CPC/2015, com o propósito de dobrar a sua renitência, que deverão ser adotadas, sobretudo, nas hipóteses em que não se possa desde logo aplicar a presunção contida na Súmula 301/STJ, ou quando se observar postura anticooperativa de que resulte o non liquet instrutório em desfavor de quem adota postura cooperativa. Por fim, aplicam-se aos terceiros que possam fornecer material genético para a realização do novo exame de DNA as mesmas diretrizes anteriormente formuladas, pois, a despeito de não serem legitimados passivos para responder à ação investigatória (legitimação ad processum), são eles legitimados para a prática de determinados e específicos atos processuais (legitimação ad actum), observando-se, por analogia, o procedimento em contraditório delineado nos arts. 401 a 404, do CPC/2015, que, inclusive, preveem a possibilidade de adoção de medidas indutivas, coercitivas, sub-rogatórias ou mandamentais ao terceiro que se encontra na posse de documento ou coisa que deva ser exibida (Rcl 37.521-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 13/05/2020, DJe 05/06/2020).
Agora, com a publicação da Lei nº 14.138/2021, que acrescentou o § 2º ao art. 2º-A da Lei nº 8.560/92, a presunção de paternidade ganhou força e poderá ser estendida aos parentes do suposto pai. De acordo com o novo dispositivo, “se o suposto pai houver falecido ou não existir notícia de seu paradeiro, o juiz determinará, a expensas do autor da ação, a realização do exame de pareamento do código genético (DNA) em parentes consanguíneos, preferindo-se os de grau mais próximo aos mais distantes, importando a recusa em presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório”.
Como a jurisprudência não admite a condução coercitiva para a realização do exame, para suprimir a eventual desídia dos parentes em colaborar com a justiça, o legislador admitiu a incidência da mesma regra inicialmente prevista na Súmula 301 do STJ. Ou seja, a presunção relativa de paternidade alcançará, do mesmo modo, o réu e seus familiares, caso se recusem a realizar o exame que esclarecerá o direito pleiteado.
Temos que ter em mente que mesmo com previsão legislativa a presunção continua a ser relativa, admitindo, portanto, prova em sentido contrário.
Tatiane Donizetti
* Imagem: Canvas